Soaram por fim uns brados de horror, de medo indefinido, de loucura total, soltados por um coro de gargantas humanas, um uivar nítido e enérgico, muito embora proviesse das profundas da terra.

Em certos momentos, parecia um som articulado, embora ninguém tivesse ouvido qualquer palavra definida; derivou depois para uma espécie de gargalhada diabólica e histérica.

Seguiu-se um queixume perfeitamente diferente do grito anterior, um som ululante, prolongado, que ora crescia ora diminuía, num paroxismo incessante.

Logo a seguir, o cheiro nauseabundo aumentou de intensidade, tornando-se perfeitamente intolerável.

A este grito maléfico pareceu responder um grito claramente humano ou um choro vindo das profundezas da quinta de Curwen.

Até 1919, o saber humano não conseguiria dar qualquer sentido a essa transcrição crua; mas Charles Ward empalideceu ao reconhecer aquilo que Mirândola, tremendo, denunciou como a mais horrenda encantação de toda a magia negra.

Ninguém percebeu o que a voz disse, porque se tratava de uma língua desconhecida, mas Luke Fenner reproduz essas palavras demoníacas do seguinte modo: "DEESMEES - JESHET - BONEDOSEFEDUVEMA - ENTTEMOSS".

Era um sono profundo, musical, grave como o do órgão, funesto como os livros proibidos dos Árabes.

Ela ecoou no céu como uma maldição e, quando o eco desta voz se desvaneceu, as janelas vibraram.

Quase ao mesmo tempo, soou a voz terrível e jamais esquecida por todos os que a ouviram.

Os Fenners não conheciam cheiro que se pudesse comparar a este fedor amorfo mas tão poderoso e repugnante como o dos cadáveres em decomposição.

Cinco minutos depois, começou a soprar um vento gélido e o ar ficou empestado por um cheiro tal que só o ar fresco do mar o impediu de chegar até aos que estavam de guarda à praia ou aos insones aldeões de Pawtuxet.

Só esta criança e ninguém mais testemunhou tal acontecimento, mas Luke diz que, por estranha coincidência, naquele mesmo instante, os três gatos que se encontravam na sala ficaram em pânico, assanhados, arqueando os dorsos e eriçando o pêlo.

A certa altura, Arthur Fenner, irmão de Luke, exclamou que estava a ver "um nevoeiro vermelho" que se elevava da quinta maldita e subia para as estrelas.

Sobreveio um silêncio que durou uns três quartos de hora.

Continuou o tiroteio e foi abatido o segundo vulto em chamas.

Fenner escreve que conseguiu distinguir estas palavras, freneticamente gritadas: "Ó Omnipotente, protege o teu cordeiro!".

Segundo vulto em chamas se levantou nos ares, segunda vez se ouviu nitidamente o som de gritos humanos.

O tiroteio fez cair imediatamente o vulto no chão.

Foi então que, do ponto onde antes se encontrava a quinta de Curwen, emergiu uma figura envolta em chamas e se ouviram gritos humanos, vozes de homens desesperados e aflitos.